De que é que se queixa quem está melhor do que eu?:
O portuguesinho é um português pequenino e isso vê-se não só pelo diminutivo. Uma das características do portuguesinho consiste em desvalorizar o sofrimento de quem sofre menos do que ele, o portuguesinho. O portuguesinho que fracturou ambas as pernas ri-se com desprezo daquele que geme a dor de ter partido apenas uma. Se o portuguesinho ganha quinhentos euros, nunca perceberá de que se queixa o outro que ganha seiscentos.
Não sei quantos portuguesinhos existem em Portugal, porque a sua existência é oscilante. Qualquer um de nós, por muito português que seja, passa por momentos em que é portuguesinho, invejando a infelicidade alheia, porque, vista daqui, até parece felicidade.
A recente vaga de emigração, consequência da miserificação do país, tem suscitado alguns comentários desagradáveis relativamente às reacções de muitos jovens que se lamentam por se verem obrigados a procurar emprego noutro país. Para alguns portuguesinhos, quem consegue arranjar emprego não tem razões para se queixar, mesmo que seja no estrangeiro e mesmo que se deva à incompetência crónica dos políticos, de facto, corruptos, mesmo que não de direito, até porque as leis são feitas por quem delas se aproveita.
Camilo Lourenço é uma das vozes do portuguesinhismo (e, só hoje, já vão dois neologismos), embora adopte um estilo mais a fugir para o marialva remediado e menos para o invejoso pobrezinho. Neste texto, imitando Miguel Relvas, esse épico de pacotilha, faz o elogio da emigração, ignorando, evidentemente, as culpas de quem pôs um país a expulsar os cidadãos.
É no último parágrafo, no entanto, que surge a caganita em cima de outra coisa ainda maior:
Fazer da emigração um bicho de sete cabeças é uma estupidez. Se os portugueses que estão a emigrar são os mais bem qualificados de sempre, a experiência internacional só os vai valorizar (como mostrou a RTP, a propósito da enfermeira que foi para a mesma cidade de Pedro Marques, e que ao fim de um ano já foi promovida!). E o país só ganha com isso. É nossa função, jornalistas, lembrar isso.
Vivemos num país que não só não alcançou o desenvolvimento que devia ter alcançado como, ainda por cima, começou a regredir, graças à parceria socrático-coelheira, nos últimos anos. Só alguém muito curto de entendimento pode, portanto, congratular-se com a emigração de profissionais qualificados, como se não fizessem falta ao país. Imagino, aliás, que os doentes que levam horas a ser atendidos nos centros de saúde e nos hospitais, em Portugal, vivam consolados por saber que há muitos enfermeiros portugueses a trabalhar… em Inglaterra.
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