A DEFESA DAS NOVAS OPORTUNIDADES: "
“E toda a realidade é um excesso, uma violência,/ Uma alucinação extraordinariamente nítida/ Que vivemos todos em comum com a fúria das almas” (Álvaro de Campos).
O anónimo que me dirigiu um comentário, dividido em meia dúzia de partes, ao meu post “Um novo fôlego para as Novas Oportunidades' (16.Out.2010), sendo que a sexta é uma repetição da quinta, quis honrar-se mais do que elucidar-me e aos leitores, através de uma longa prédica que peca à partida por ser subscrita por quem, segundo ele próprio, ”gere um centro de Novas Oportunidades” espalhando e exaltando as doutrinas a que elas se subordinam, mas escamoteando as desgraças por elas produzidas. Ora, como diziam os latinos, “laus in ore próprio vilescit”.
O anónimo que me dirigiu um comentário, dividido em meia dúzia de partes, ao meu post “Um novo fôlego para as Novas Oportunidades' (16.Out.2010), sendo que a sexta é uma repetição da quinta, quis honrar-se mais do que elucidar-me e aos leitores, através de uma longa prédica que peca à partida por ser subscrita por quem, segundo ele próprio, ”gere um centro de Novas Oportunidades” espalhando e exaltando as doutrinas a que elas se subordinam, mas escamoteando as desgraças por elas produzidas. Ora, como diziam os latinos, “laus in ore próprio vilescit”.
O comentário em questão encerra uma tese. Reportemo-nos agora a comentários que encerram antíteses para daqui ser feita a necessária síntese. Assim, num comentário a um meu post anterior, “O Elogio da Ignorância” (11/10/2010), é apresentado o testemunho seguinte (11.Out.2010):
“Há já algum tempo que não comento os seus artigos, mas fá-lo-ei agora, infelizmente, sob anonimato por razões que rapidamente entenderá.
Apresentei currículo e fui consagrado em Diário da República como Avaliador Externo dos Centros de Novas oportunidades. Em Lisboa, em reunião geral, de expectantes crentes como eu, disseram-nos que éramos a pedra angular do sistema. Disseram isto instados por assistentes que já conheciam da poda e já tinham visto o tombo. Mais disseram, após a apologia da coisa,que nos competia, a nós avaliadores, zelar pela idoneidade do processo. Que quando algo corresse mal se mandava rever, apreciar, sugerir, talvez, novas competências mais elásticas...
Assisti a quatro ou cinco cerimónias públicas de 'defesa/apresentação' (já consumada, quando chega a esse estádio de desenvolvimento) do trabalho dos formandos adultos. O que vi e ouvi de todos (formandos, formadores e até do avaliador externo - cheio de dúvidas a deshoras)foi suficiente para me lembrar do Medina Carreira e decidi não comer (nunca) daquela gamela.
Como aqui já disse um formador lúcido, haja um pingo de decência no modo como se desqualificam as pessoas, enganando-as e ao país.
Tirando honrosas excepções (que, certamente, existirão), as Novas Oportunidades nem tradução do verdadeiro ensino são; nem calão!: são a certificação total e estatal da incapacidade nacional de acreditar no valor da Educação”.
Um outro anónimo, escreve no meu post “O Facilitês' (14.Out.2010):
“Continuando os testemunhos sobre a verdadeira realidade do sistema Novas Oportunidades, deixo aqui o meu testemunho enquanto esposa de um aluno desse sistema, na modalidade de reconhecimento, certificação e validação de competências.
O meu marido desistiu cedo da escola para começar a trabalhar, tendo concluído o 7º ano de escolaridade. Mais tarde, já depois de nos termos casado, insisti com ele e inscreveu-se no extinto ensino recorrente por unidades capitalizáveis, onde ainda aprendeu conteúdos ligados a diversas disciplinas, como História, Matemática, Ciências, Português e Inglês. Recordo-me do 1º dia em que teve aulas, durante a noite, ele vinha completamente angustiado e estafado. Achava que não ia conseguir acompanhar as aulas, depois de tantos anos fora do sistema educativo. Não desistiu e em 2 anos (os 2 últimos deste ensino recorrente) conseguiu completar, por seu esforço, o 9º ano de escolaridade. Sentiu, animado, que o desafio tinha sido superado e que tinha feito aprendizagens significativas nas diversas áreas.
Depois... quis continuar, mas os horários do secundário do ensino recorrente por módulos, que ainda existia, eram incompatíveis com a vida profissional. Então, inscreveu-se num centro novas oportunidades. As poucas sessões presenciais que tiveram decorreram na Junta de Freguesia da nossa zona de residência e a maior parte dos trabalhos escritos (a história de vida!) foram melhorados por mim...
Entretanto, em cerca de um ano, praticamente sem ter aprendido nada, ficou com o certificado do ensino secundário…”
Um outro testemunho, nesse mesmo post, com a chancela do nome do autor, João Filipe Oliveira, reza:
“Fui avaliador externo desde início do RVCC até o sistema ter entrado em fase de propaganda. Pedi para ser retirado da bolsa quando começou a ser prática certificar 9.º ano com base em 'evidências' como conferir trocos no supermercado, redigir recados, saber ir à internet e coisas do género. Foi a gota de água”.
Recuemos no tempo, detendo-nos numa carta do “Expresso” (8.Dez.2007) em que um dos formadores das Novas Oportunidades denuncia ao mais alto magistrado da Nação, Aníbal Cavaco Silva, o estado de espírito, quase diria de reinação, vivido nas Novas Oportunidades como se de uma colónia de férias se tratasse. Escreveu ele: “Estes frequentadores da escola aparecem nas aulas sem trazer uma esferográfica ou uma folha de papel. Trazem o boné, o telemóvel, os ‘headphones’ e uma vontade incrível de não aprender e não deixar aprender”.
Muitos mais exemplos antitéticos poderiam ser apresentados à tese oficial de um declarado paladino das Novas Oportunidades. Não o farei, para não abusar da paciência do leitor. Julgo ter deixado aqui matéria mais do que suficiente, alguma dela sem ser sob anonimato (embora respeite e compreenda o anonimato de uns tantos comentários pelo evidente perigo de retaliação), para que sejam tiradas as ilações pertinentes que deixaram de me pertencer ou ao autor do referido comentário abonatório da excelsas virtudes das Novas Oportunidades.
Mas, de forma alguma, poderia terminar sem lamentar “o sacudir de água do capote” (termo da gíria militar) quando ele atira para cima dos ombros dos formadores das Novas Oportunidades a responsabilidade daquilo que aí decorre menos bem, ou até mal. Assim, em reprodução do comentário em causa a culpa não morre solteira, como é uso neste país, recaindo numa trilogia de pecados capitais da responsabilidade de:
1. “Formadores que não estão preparados ou motivados para trabalharem com populações adultas extremamente frágeis do ponto de vista emocional, social e cognitivo, muitas delas com vários anos de escolaridade, mas que mal sabem ler e escrever, apesar dos diplomas escolares que trazem; que não estão preparados para trabalharem com pessoas pobres, necessitadas, mas que também não estão reparados (como pessoas) para aprenderem a trabalhar com e a acreditar que podem ter um papel de relevo na qualificação das pessoas deste país'.
2. “Formadores que não acreditam no que fazem e sem espinha dorsal para se afirmarem enquanto tal, que não se esforçam, que não perseguem ideais de qualidade, de excelência e que não se opõem criticamente quando são obrigados a fazer um trabalho de menor qualidade'.
3. “Formadores que, mesmo num processo de RVCC que, repito, não é um processo de aprendizagem, mas um longo exame do que a pessoa aprendeu, não acreditam na capacidade humana de aprender e de melhorar, que não têm a menor consciência da importância na vida dos que nos procuram de melhores habilitações escolares e na criação de uma atitude positiva face ao conhecimento, à aprendizagem, à procura de caminhos de qualidade de excelência”.
Ou seja, como se as Novas Oportunidades se tratassem de uma religião, a doutrina é excelente os seus intérpretes é que são maus.
Finalmente é-me imputada a ignorância do meu completo desconhecimento de que “a Iniciativa Novas Oportunidades acolhe todas as pessoas, mesmo os licenciados. Posso-lhe dizer que no meu Centro, cerca de 10% dos inscritos são pessoas (cerca de 110 indivíduos) que, à data da inscrição, já possuíam habilitações de 12º ano, obtidas pelo ensino regular e também dizer-lhe que até pessoas com mestrado temos inscritos.”
Este facto demonstra à saciedade e à própria sociedade que o desemprego nos detentores de licenciaturas e até mestrados académicos é tão grave que os obriga a andar de cavalo para burro. Ou será que as Novas Oportunidades significam andar de burro para cavalo? Em sentido figurado, claro está!
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